USADOS EM CELEBRAÇÕES, TIROS PARA O ALTO PODEM ATINGIR ALVOS NO CHÃO A 360KM/H E PERFURAR CRÂNIOS

Por Lucas Gomes / O Tempo
Prática comum em festas de fim de ano e em momentos de festa, os tiros para o alto representam perigo para a população e podem ser classificados como crime em algumas situações. Embora muitos considerem o gesto uma forma de celebração, os disparos realizados para o céu retornam com velocidade capaz de causar ferimentos graves e até mortes.
O artigo 15 do Estatuto do Desarmamento estipula que o disparo de arma de fogo é crime quando feito em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela. A prática se encaixa nessa tipificação quando o atirador não tem como finalidade a prática de outro crime, como homicídio, ameaças ou danos a algum patrimônio, por exemplo. A pena para quem dispara sem um alvo específico é de 2 a 4 anos de prisão e o crime é inafiançável.
A chefe da Sala de Imprensa e porta-voz da Polícia Militar de Minas Gerais, major Layla Brunnela, explica que a munição quando retorna do alto tem capacidade de lesionar, ferir, causar dano ou até mesmo de matar alguém que esteja nas redondezas. “Não é uma prática aconselhável e pode configurar diversos delitos a depender de cada caso. Infelizmente nós temos algumas pessoas que fazem isso com intuito de comemoração, com intuito diverso da prática de crime. Mas pode acontecer, mesmo que sem intenção, de alguém sair ferido dessa situação”, afirmou.
Conforme a militar, é complexo dar dicas de proteção para não ser atingido por uma bala perdida, uma vez que não se sabe quando vai acontecer e qual a trajetória do projétil. “Você pode estar na sua casa, a munição perfurar o telhado e te atingir no sofá”, exemplificou. No último fim de semana, um adolescente de 17 anos ficou gravemente ferido durante uma festa em uma fazenda de São Gotardo, no Alto Paranaíba. O amigo dele, filho de um vereador eleito na cidade, atirou para o alto e, na queda, o projétil atingiu o garoto, que foi socorrido em estado grave. A vítima corre risco de morte e, caso sobreviva, os médicos informaram à família que são grandes as chances de paraplegia.
O estudo “Spent Bullets and Their Injuries: the Result of Firing Weapons Into the Sky” (Balas perdidas e seus ferimentos: o resultado de atirar para o céu, em tradução livre), feito em um hospital de Los Angeles, nos Estados Unidos, avaliou 118 vítimas de balas perdidas que “caíram do céu” atendidos pelo centro médico entre 1985 e 1992. Desses pacientes, 77% foram atingidos na cabeça. A taxa de mortalidade foi de 32%, número “significativamente maior do que de todas as vítimas atingidas por disparo de arma de fogo no mesmo centro médico”, segundo o estudo assinado pelos médicos Gary J. Ordog, Peter Dornhoffer, Greg Ackroyd, Jonathan Wasserberger, Michael Bishop, William Shoemaker e Subramanium Balasubramanium.
Nos Estados Unidos, o maior número de vítimas de balas que “caíram do céu” foi registrado no Feriado da Independência e na virada de ano. O estudo é relevante, mas precisa ser avaliado de acordo com a cultura local, segundo o perito criminal João Bosco Silvino Júnior, do Instituto de Criminalística da Polícia Civil de Minas Gerais. Isso porque, usualmente, os calibres usados nos Estados Unidos são maiores do que aqueles mais frequentes no Brasil.
O perito explicou que o tiro para cima pode causar lesões, mas depende de cada situação, do ângulo do disparo, da massa do projétil, da região atingida na vítima, entre outras variáveis. “Os projéteis mais pesados vão atingir velocidades maiores na queda. O peso do projétil está relacionado ao calibre, se pegar calibres leves, vai atingir velocidade muito baixa quando retornar no movimento de queda dele. Sobre angulação, se o tiro for reto, ou seja, totalmente vertical, é uma coisa. Se for com algum ângulo, isso faz com que o tiro chegue em velocidade maior. É comum termos esses aumentos no fim de ano. Temos pessoas que fazem isso como celebração, em festas e até em jogos de futebol”, detalhou.
O perito fez uma estimativa de velocidade de saída e queda de projétil de uma das munições mais usadas no Brasil. “Um tiro de calibre 9mm Luger atinge uma altura vertical de aproximadamente 2.000 metros com velocidade inicial de 1.200 km/h. A velocidade final na queda é limitada pela resistência do ar em e fica entre 180km/h e 360 km/h. É uma velocidade muito baixa comparada à velocidade com que o projétil sai da boca do cano. Mas pode causar lesões, vai depender de onde atinge e da estrutura da vítima. Tem velocidade suficiente até para perfurar a calota craniana”, explicou. A ressalva do perito é de que os números podem variar conforme os parâmetros já citados, como angulação do disparo. Neste caso, ele analisou um disparo em ângulo reto. Ou seja, totalmente para cima, que é menos letal. Para um calibre 38, usado em revólver, a altura máxima atingida é de 1.700 metros aproximadamente com velocidade inicial de 970 km/h. Já um calibre 380 atinge a altura de 850 metros e sai da arma a 1.000 km/h. Ambos também chegam ao chão com velocidade entre 180km/h e 360km/h.
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